13/11/2011
Para Erick Pereira, uma reforma política agora ainda não vai frear os excessos
[0] Comentários | Deixe seu comentário.Mestre em Direito do Estado e Doutor em Direito Constitucional pela PUC/SP, o advogado natalense Erick Wilson Pereira tem sido uma fonte consistente de informações quando o assunto é lei da Ficha Limpa, Reforma Política, Direito Eleitoral...
Erick tem sido constantemente consultado pela imprensa local e nacional.
Essa semana ele participou, em São Paulo, do Congresso Internacional de Direito Eleitoral, onde foram abordados exatamente os temas mais debatidos pelo advogado, entrevistado de hoje no quadro FIM DE SEMANA:
Thaisa Galvão - Qual a crítica que o senhor faz aos partidos diante da constante ausência de uma Reforma Política?
Erick Pereira - Tendo como principal função intermediar o diálogo entre a sociedade e as instituições democráticas, os partidos políticos passam a servir à perpetuação do poder constituído quando se travestem de tutores ou controladores das vontades populares, selecionando-as conforme os interesses de grupos, de forma a exercer ascendência sobre as relações de poder.
A ausência de um verdadeiro debate público consolida uma postura de subserviência aos donos do poder e distancia a construção de um espaço crítico para aqueles que deveriam ser soberanos nas escolhas dos seus mandatários.
Na falta de discussões sobre temas polêmicos, como a reforma eleitoral e partidária tomam assento os jogos midiáticos, os factóides e os debates periféricos. As mudanças seguem o dito de Tomasi di Lampedusa, para quem é preciso que tudo mude para que tudo se mantenha.
Thaisa Galvão - Há, então, crise de representatividade? E as coligações ajudam ou atrapalham?
Erick Pereira - O maior exemplo desta distorção foi o constrangimento da eleição do palhaço Tiririca. Suspeita-se, também, que o propulsor da candidatura do palhaço não tenha sido o incentivo materno, mas a astúcia de lideranças do PR em escolher um grande puxador de votos. De fato, o ultrapassado sistema proporcional previsto pela legislação eleitoral propiciou a eleição de três candidatos coligados (PC do B, PRB e PT) que, sem os votos de Tiririca, não estariam eleitos. E, ironicamente, entre os beneficiários da expressiva votação no exótico, bizarro, esdrúxulo, qualquer que seja a denominação que os cientistas sociais dêem ao fenômeno, encontra-se o destemido e idealista delegado Protógenes (PC do B), o paladino da luta contra a corrupção a qualquer custo, o ex-policial federal que não mediu esforços para incriminar o empresário Daniel Dantas, a ponto de se incriminar. O que também não deixa de ser exótico no país dos escândalos impunes, cuja parcela alienada e inescrupulosa do eleitorado ainda apostou em “fichas sujas” notórios, a ponto de deixar, em estado de suspensão, resultados de alta relevância para o desfecho das eleições.
Thaisa Galvão - Qual a sua análise da lei do 'Ficha Limpa'?
Erick Pereira - Abstraídas as valorosas intenções ao sabor da pressão popular, o ficha limpa não apenas amplia as causas de inelegibilidade, mas subverte o processo eleitoral mediante restrições ao exercício de direito de natureza política e ao arrepio de princípios do Direito. É, portanto, norma restritiva do exercício da cidadania pela criação de direitos políticos negativos, ao passo que o Direito Eleitoral consagra a plenitude dos direitos positivos e o respeito à soberania popular (art. 1º, parágrafo único, CF/88), o que impõe interpretação estrita, mais favorável ao cidadão, evitando-se relativizar a vontade coletiva mediante escolhas antecipadas pelo Judiciário. E, na colisão de princípios entre a soberania popular e a probidade, deve preponderar o primeiro. Mesmo assim, os julgamentos proferidos, sejam pelos Tribunais de Contas ou pelo Judiciário, merecem muitos cuidados para quem pretende submeter o nome ao eleitorado de 2012.
Thaisa Galvão - Como o senhor vê a participação da internet em 2012?
Erick Pereira - É muito salutar para a democracia. Quanto maior o número desses veículos de informação, melhor será para o eleitor. E é necessário atentar que a tão esperada e morosa regulamentação desse meio de comunicação (internet, blog, face, twitter, sites) foi surpreendentemente iniciada pelo Judiciário, o qual, a título de “interpretação sistemática” do ordenamento, legislou acerca da possibilidade da propaganda na internet, agora liberada para o pleito de 2012 na sua amplitude. Na esteira do vácuo legislativo, os argumentos dos nossos ministros mais uma vez buscaram a concretude maior da nossa Constituição.
Thaisa Galvão - Como o senhor vê os exageros cometidos em uma campanha?
Erick Pereira - Nos últimos anos, apesar das freqüentes mudanças nos tipos penais/eleitorais e no modo de operação das constantes práticas irregulares no processo eleitoral verificadas, sobretudo após o registro de candidaturas, muitas a título de barganha de benefícios individuais e a transformar a indecência em fato corriqueiro para se conseguir o voto, o nosso Poder Judiciário não fechou os olhos e não se omitiu no enfrentamento de questão relevante à própria moralidade. Por outro lado, esses exageros consentidos pela capenga legislação, dependente de uma assessoria jurídica qualificada que transferiria a segurança de fiscalização dos excessos que por ventura os adversários pretendam praticar.
Thaisa Galvão - O que é preciso para evitar tantas irregularidades? Uma Reforma Política?
Erick Pereira - Penso que a ânsia pelo poder é incontrolável. Todavia, a eficácia e legitimidade de reformas políticas passam necessariamente pelo diálogo entre organizações da sociedade civil, representações políticas e partidos políticos. O bom funcionamento de cada uma destas esferas e os acordos estabelecidos entre elas, são aspectos imprescindíveis para se afirmar práticas e valores democráticos, a exemplo da estruturação de relações de poder mais harmônicas e igualitárias, da redistribuição de oportunidades de acesso à representação política, além do fortalecimento de organizações políticas partidárias e não partidárias. Entendo que, embora tais práticas há muito venham sendo demandadas pela sociedade brasileira, não será desta vez que a reforma política resgatada pela nova legislatura as contemplará ao ponto de frear os excessos. Os debates têm sido praticamente monopolizados pelo Legislativo, em detrimento das organizações da sociedade civil.