Na queda de braço entre governo e PMDB, lei do deputado Walter Alves é 'engavetada'
[0] Comentários | Deixe seu
comentário.
Na queda de braço travada entre o PMDB e o governo do Estado do Rio Grande do Norte, com rompimento à vista, uma das reclamações do partido tem sido a falta de atenção por parte do governo Rosalba Ciarlini.
Na Tribuna do Norte deste domingo, a reportagem que rendeu a principal manchete, mostra uma lei do deputado Walter Alves, líder do PMDB na Assembleia, já sancionada pelo governo, porém...esquecida.
O jornal, presidido pelo deputado Henrique Alves (PMDB), dá detalhes sobre a lei, apontando prejuízos para a população sem sua aplicação.
Eis a reportagem que, além da questão administrativa, explica um dos porquês do provável rompimento entre o PMDB e o governo Rosa:
Poupança fiscal está engavetada
Andrielle Mendes - repórter
'Desequilíbrios financeiros' têm, segundo a Secretaria Estadual de Tributação, impedido o Rio Grande do Norte de regulamentar uma lei que beneficia diretamente o contribuinte. O governo do estado sancionou há exatamente um ano, e tenta regulamentar desde então, a Poupança Fiscal, lei que, a exemplo da Nota Fiscal Paulista, devolve até 30% do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) pago pelo contribuinte. Em São Paulo, o valor devolvido pode ser sacado direto na conta ou usado para abater outros impostos.
As regras no RN ainda não estão claras. Só com a regulamentação é que o contribuinte potiguar vai saber quanto será devolvido, em quanto tempo o crédito poderá ser resgatado, e onde poderá ser aplicado. Em São Paulo, local onde o deputado estadual Walter Alves, autor do projeto de lei, esteve antes de apresentar o projeto, basta o contribuinte informar uma conta bancária no site do programa para resgatar o dinheiro.
Lá também é possível usar o valor para abater ou quitar o IPVA, desde que o veículo esteja no nome do participante do programa. Para pedir o resgate, basta informar o CPF ou CNPJ e a senha cadastrada e solicitar a opção desejada. O valor é creditado na conta uma semana após o pedido e fica à disposição do contribuinte por até cinco anos. O potiguar Cleanto Roberto, 56 anos, gostou da ideia. O professor não costuma pedir nota fiscal em todos os estabelecimentos comerciais, mas admite que mudaria de hábito se houvesse algum tipo de compensação financeira.
A questão é que por aqui a lei ainda deve demorar a entrar em vigor. O governo do Estado sancionou a lei há um ano e ainda não sabe quando realmente a regulamentará. "A lei propõe que até 30% do imposto seja devolvido ao contribuinte. É um percentual muito alto. O que ocorre é que o governo, em função dos desequilíbrios financeiros, não pôde regulamentar a lei até agora", afirma José Aírton, secretário estadual de Tributação.
Aírton explica que 'qualquer coisa que gere receita será deixada para um segundo momento' e admite que a Secretaria já pensa em reduzir o percentual que será devolvido ao contribuinte no estado.
Embora o autor da lei, deputado Walter Alves, acredite que haverá ganho de arrecadação - os contribuintes passarão a exigir nota fiscal, a sonegação vai cair, e o estado arrecadará mais - José Aírton não tem muita certeza do impacto da nova lei. "Com a sonegação do jeito que está, não tenho certeza nenhuma do impacto. Também não se sabe quanto a Poupança Fiscal vai gerar de despesa", afirma o secretário. Cálculos estão sendo feitos para se chegar ao real impacto da regulamentação.
O imposto - embutido nos preços - deixa de pertencer ao contribuinte, e passa a ser 'propriedade' do Estado no instante em que o contribuinte paga pelo produto ou serviço, num estabelecimento legalizado. Devolvê-lo, mesmo que parcialmente, explica José Aírton, seria abrir mão de parte da receita do Estado, que tem no ICMS uma de suas principais fontes de arrecadação. "Não podemos abrir mão de nenhuma receita neste momento", afirma José Aírton, secretário de Tributação, que recebeu a missão de regulamentar a lei no estado.
Em São Paulo, o número de contribuintes cadastrados já ultrapassa os 14,1 milhões - quatro vezes a população do RN - e o total distribuído entre os contribuintes já chega aos R$ 6,9 bilhões, segundo dados da Secretaria da Fazenda de São Paulo. A lei que criou a Nota Fiscal Paulista foi regulamentada há quase seis anos.
*
Dirigentes lojistas do RN cobram mais transparência
O presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do RN (FCDL-RN), Marcelo Rosado, cobra mais transparência do governo federal, estadual e municipal quanto a aplicação dos tributos. "O governo exige um alto nível de eficiência do empresariado, coisa de primeiro mundo. Por outro lado, não se vê eficiência por parte do governo, na gestão de recursos que ele arrecada".
Estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) e divulgado ainda em 2011 mostrava que o Brasil era o país que proporciona o pior retorno dos valores arrecadados em bem-estar para seus cidadãos, entre os 30 países com as maiores cargas tributárias. Para chegar ao ranking, o instituto utilizou dois critérios: a carga fiscal em relação ao PIB (Produto Interno Bruto) e o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).
Na época da divulgação do estudo, o presidente do IBPT, João Eloi Olenike, explicou que o Brasil ficava em último porque tinha carga tributária elevada e IDH baixo. O professor Cleanto Roberto, 56, chega a se irritar quando pensa na carga tributária do país. "Pagamos altos impostos e não vemos melhorias na educação, na saúde. A saúde está um caos e o estado está repleto de obras inacabadas", reclamou. Cleanto até já decidiu o que vai fazer com o crédito que terá direito, dentro do Poupança Fiscal. "Vou investir na saúde e educação dos meninos".
O valor arrecadado pelo Estado por meio dos impostos deveria ser revertido para o bem comum, para investimentos e custeio de bens públicos, como saúde, educação ou segurança pública. "No entanto, na prática, como o imposto não está vinculado ao destino das verbas, ao contrário de taxas e contribuições, pagá-lo não dá garantia de retorno", diz artigo, sem assinatura, publicado no portal Finanças Práticas.
*
Tributação testa Nota Eletrônica
Para viabilizar o Poupança Fiscal, a Secretaria Estadual de Tributação tem apostado num outro projeto, o Nota Fiscal Eletrônica do Consumidor (NFC-e), ainda em fase de testes. A emissão da NFC-e, que é uma nova vertente da Nota Fiscal Eletrônica, dispensa a impressão dos cupons fiscais tradicionais e utiliza apenas um programa gratuito que estará disponível no site do Ministério da Fazenda.
Com a implantação do projeto, o governo passará a acompanhar mais de perto todas as transações realizadas pelos estabelecimentos comerciais. As notas serão diretamente enviadas para os bancos de dados das Secretarias de Fazenda. Com isso, o governo reduz os riscos de sonegação e arrecada mais.
"A arrecadação subirá. Só não dá para dizer ainda se ela subirá ao ponto de viabilizar o Poupança Fiscal". O desafio não para por aí. O governo também precisa encontrar uma forma de manter o Cidadão Nota 10, que funciona à base de doações de notas fiscais.
*
Proposta vai fortalecer as empresas formais
A regulamentação da Poupança Fiscal, acredita Marcelo Rosado, empresário e presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Rio Grande do Norte (FCDL-RN), fortalecerá as empresas legais e estimulará a formalização das empresas no estado. Eugênio Medeiros, empresário e economista, pensa parecido.
"A lei fortalecerá as empresas legais, por que o consumidor vai preferir comprar no estabelecimento legalizado. Ele vai passar a pedir a nota fiscal". "Hoje, o contribuinte não pede a nota fiscal. Ele não tem interesse, por que isso não lhe beneficia diretamente. A partir do momento que regulamentarem a lei, ele passará a exigir", acrescenta Marcelo.
Embora a lei tenha como principal objetivo, segundo o deputado Walter Alves, autor do projeto, estimular a cidadania fiscal, Marcelo e Eugênio concordam que a intenção do governo ao sancioná-lo é arrecadar mais. Com maior o controle - mesmo que este seja feito pelo próprio contribuinte ao exigir a nota fiscal - menor o risco de sonegação de impostos. E quanto menor a sonegação, maior a arrecadação do Estado. O Governo do Estado ainda fecha o balanço do ano, mas acredita ter arrecadado só em 2012 R$ 3,65 bilhões de ICMS. O valor é 16,24% superior ao arrecadado com ICMS em 2011.
*
Nota terá que discriminar valor dos impostos
Já é lei. A nota fiscal deverá informar, a partir de junho deste ano, o valor dos impostos embutidos no preço dos produtos e serviços adquiridos. A lei nº 12.741/12 foi sancionada em dezembro pela presidenta Dilma Rousseff e determina que pelo menos nove impostos sejam identificados na nota fiscal.
Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e Imposto sobre Serviços (ISS) são apenas alguns deles.
"A informação vai tornar visível o que está sendo pago", afirmou o deputado Guilherme Campos (SP), relator do projeto na Comissão de Finanças e Tributação na Câmara, em entrevista ao Estadão, por ocasião da aprovação do projeto na Câmara, em novembro.
A doméstica Silvana Brito Mendes do Nascimento, 40, concorda. "A gente paga e nem percebe o que está pagando", afirma. Silvana pode até não perceber, mas eles estão lá. Estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) revelou que a carga tributária incidente sobre alguns produtos, como a gasolina, superam os 50%, no Brasil.
Só ano passado, o Brasil arrecadou R$ 1 trilhão com tributos. Foi o quinto ano consecutivo em que o país atingiu esta marca.