01/02/2014
Justiça: Superexposição X Censura
[0] Comentários | Deixe seu comentário.Até que ponto vale a transmissão ao vivo de um julgamento? E até que ponto a superexposição de uma tramsissão ao vivo se diferencia de uma entrevista feita por um jornalista com um magistrado? O tema polêmico ocupou parte da sessão de quinta-feira no TRE-RN. Tudo por causa de uma entrevista de um membro da Corte Eleitoral ao Blog. Nada mais nada menos do que toda a Corte faz...de microfone na mão e câmeras apontadas para eles, transmitindo ao vivo tudo que eles dizem. E eles dizem muito mais do que numa simples entrevista à imprensa. A superexposição é tema de artigo do advogado Erick Pereira no NJ deste sábado. Em nota na quinta-feira, escrevi que, para evitar esses encontros e desencontros, o Tribunal teria que acabar com as transmissões e realizar seus julgamentos entre 4 paredes...sem testemunhas. Erick levanta a possibilidade do Congresso passar a censurar as transmissões no STF... Eis o artigo, com base na palestra do ministro Joaquim Barbosa que o advogado potiguar assistiu na semana passada em Paris. * Superexposição (1) Erick Pereira Em recente conferência realizada na Sorbonne sobre a influência da publicidade na racionalidade das decisões tomadas pelo Supremo Tribunal, o ministro Joaquim Barbosa afirmou que o fenômeno da superexposição durante transmissões ao vivo se reflete na maneira como certos ministros deliberam e sobre o conteúdo de algumas decisões. A constatação é de uma franqueza estarrecedora, especialmente quanto ao segundo efeito. Não que o ministro discorde do modelo democrático de supertransparência adotado pela TV Justiça, mas das imperfeições nele observadas, a exemplo do estímulo à individualidade e à falta de objetividade dos magistrados. A individualidade que, ao prevalecer sobre o colegiado, obscurece os fundamentos das decisões. Difícil discordar das opiniões do presidente do Supremo, embora suas conclusões possam ser vistas como demasiadamente otimistas ao conclamar jornalistas à “decência” – prefiro imaginar que o ministro quis se referir à reserva - de se concentrarem nas questões jurídicas e ministros à “moderação” da individualidade que deve prevalecer sobre o colegiado. Pois tanto é difícil reservar-se a apenas publicar o conteúdo de decisões, quando estas são proferidas por egos inflamados e ideologicamente dissonantes, quanto moderar-se, quando se é persona outorgada de grande poder e exposta a milhões de olhos expectantes. O grande público, que compartilha com os jornalistas a avidez por extrair o máximo de incidentes mínimos, é plateia caprichosa que aprecia fatos e ações hiperbólicas, liturgias e paramentos, e amiúde desqualifica o que não parece obviedade. Não foi por desconhecer a natureza humana que Schopenhauer, do alto do seu realismo, atribuiu à opinião alheia a origem do nosso amor próprio, “de todas as vaidades e pretensões, bem como de nosso fausto e de nossa presunção”. O mundo jurídico é promissor incubador do germe da vaidade, pois detém todas as condições para o seu desabrochar. Ao ultrapassar os limites aceitáveis do narcisismo e da busca por admiração, a vaidade não é apenas danosa aos seus portadores, mas àqueles que se socorrem do Judiciário. Pior quando se alia à retórica pomposa, ao exibicionismo intelectual, aos ressentimentos incontidos, à prepotência mal disfarçada de árbitro dos litígios. Se a adoção da transmissão de julgamentos ao vivo tem contribuído para tornar a Justiça ente desmitificado e acessível aos olhos dos cidadãos leigos, observa-se um desencantamento em razão de exposições inapropriadas à solenidade do Judiciário. Não admira já tramitar no Congresso um Projeto de Lei para vetar as transmissões em tempo real das plenárias do Supremo.