28/12/2014
Bahia acaba de aprovar lei que garante pensão vitalícia ao governador, seguindo o que ocorre em vários estados
[0] Comentários | Deixe seu comentário.O jornal O Globo traz hoje, em manchete, reportagem mostrando que Estados pagam pensão a 104 ex-governadores e a 53 viúvas de ex-governadores.
Cita, por exemplo, o senador José Agripino Maia (DEM), que recebe pensão de 11 mil reais, e a governadora Roseana Sarney (PMDB), que terá pensão mensal de 24 mil reais a partir de janeiro.
No Rio Grande do Norte a lei já foi extinta, ao contrário da Bahia, que acaba de aprovar a lei para beneficiar o ainda governador Jacques Wagner (PT), que deixará o governo baiano com uma aposentadoria de 19 mil reais.
Uma mistura de partidos beneficiados, onde ninguém aponta o dedo para ninguém.
Eis a reportagem:
ESTADOS PAGAM PENSÃO A 104 EX-GOVERNADORES
Benefício existe em 21 unidades da federação e custa R$ 47 milhões ao ano
POR SIMONE IGLESIAS E CHICO DE GOIS
BRASÍLIA — Levantamento feito pelo GLOBO nas 27 unidades da federação mostra que 157 ex-governadores e ex-primeiras-damas recebem aposentadorias especiais e pensões vitalícias que variam de R$ 10,5 mil a R$ 26,5 mil, o que significa um custo anual aos cofres estaduais de R$ 46,8 milhões. É uma casta formada por 104 ex-governadores e 53 viúvas. Neste mês, Roseana Sarney (PMDB), que governava o Maranhão e renunciou ao cargo, fez o pedido da pensão ao tesouro de seu estado e passará a receber R$ 24 mil, além dos R$ 23 mil que já acumula por ser funcionária aposentada do Senado.
A regalia não tem coloração partidária. O petista Jaques Wagner, que deixará o governo da Bahia no dia 1º de janeiro, passará a receber automaticamente R$ 19,3 mil por mês. Este estado foi o último a aprovar uma lei garantindo o benefício aos seus ex-governadores, em novembro passado. A lei foi feita sob encomenda para beneficiar o próprio Wagner, que deve virar um superministro do governo da presidente Dilma Rousseff. Mas um dos mais emblemáticos líderes da oposição, o presidente do DEM, Agripino Maia (RN), também recebe R$ 11 mil de pensão pelo seu estado como ex-governador — que soma-se aos vencimentos de R$ 26,7 mil do Senado.
APOSENTADORIA RESSUSCITADA NO ACRE
No Acre, estado governado há 15 anos pelo PT, a lei foi revogada antes dos irmãos Viana chegarem ao poder. Mas assim que assumiu, em 1999, Jorge Viana ressuscitou a aposentadoria especial. Os tucanos também se beneficiam das regras locais. O senador Cássio Cunha Lima, que governou a Paraíba, tem direito a R$ 23,5 mil de pensão, além do seu salário do Senado, de R$ 26,5 mil. A ex-governadora gaúcha Yeda Crusius é outra tucana que, ao deixar o cargo, requereu o benefício, que no Rio Grande do Sul é de R$ 26,5 mil.
Os estados agem no vácuo de uma regra federal. Até 1988, os ex-presidentes da República tinham direito ao recebimento de uma aposentadoria. Os estados, então, replicavam o benefício para os chefes do poder local. Mas a Constituição Cidadã acabou com o benefício, mas não proibiu explicitamente a concessão aos governadores. Alguns estados suspenderam então a regalia aos seus ex-governadores a partir de 1989, quando refeitas as constituições estaduais. Outros simplesmente ignoraram as mudanças na Carta Magna e mantiveram ou, ainda, criaram ao longo das últimas duas décadas a concessão da aposentadoria, casos do Acre e Bahia, entre outros. O entendimento dos estados é que eles têm “autonomia” pela Constituição para decidirem o que quiserem.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contesta os estados e move atualmente 11 ações diretas de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) contra os benefícios locais. Os processos estão parados nas mãos de ministros, o que permite aos governos estaduais manterem os pagamentos. Neste momento, apenas um estado não está conseguindo pagar os benefícios, por uma decisão local: Roraima. Uma decisão do Tribunal de Justiça do estado suspendeu em maio deste ano o repasse da pensão aos ex-governadores e viúvas. Como não existe jurisprudência, nem uma súmula vinculante sobre esse tipo de conduta, no momento em que a decisão estadual cair, todos voltam a receber até que o Supremo se posicione claramente sobre a questão.
Dos 26 estados e o Distrito Federal, 21, uma esmagadora maioria, pagam as aposentadorias vitalícias. Em 11 deles — Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Pará, Roraima, Acre, Bahia, Rondônia, Maranhão, Amazonas e Paraíba — a regra está ativa e vale para os governadores que deixarão os cargos dia 1º de janeiro. Pelas constituições estaduais, alguns têm que requerer o benefício; outros passam a receber automaticamente. Em outros dez estados — Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Sergipe, Rio Grande do Norte, Alagoas, Ceará e Piauí — as leis foram revogadas. No entanto, governadores que ocuparam o cargo antes da revogação das leis e ex-primeiras-damas permanecem recebendo.
DOIS BENEFÍCIOS PARA EX-COMPANHEIRA
Neste seleto grupo, há dois casos curiosos. Marilia Guilhermina Pinheiro Martins, reconhecida como companheira do ex-governador Leonel Brizola, recebe duas pensões, uma pelo Rio de Janeiro e outra pelo Rio Grande do Sul, já que ele administrou os dois estados. A soma dos vencimentos de Guilhermina é de R$ 48,3 mil mensais. Outro caso é o de Pedro Pedrossian, que foi governador do Mato Grosso antes da divisão e, anos mais tarde, administrou o Mato Grosso do Sul. Pedrossian se beneficia de duas pensões: uma paga pelos cofres do Mato Grosso e outra paga pelos cofres do Mato Grosso do Sul. O total da pensão chega a R$ 50 mil.
Como base das ações no STF, a OAB sustenta que a manutenção do pagamento das aposentadorias é uma agressão e uma ofensa ao princípio da moralidade, da impessoalidade e da isonomia. Nas ações, a ordem cita o artigo 37 da Constituição Federal que estabelece os princípios da “legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência na administração pública”.
Segundo a OAB, os estados que mantém ativos os benefícios nas suas constituições estão descumprindo um preceito constitucional superior.
Os governadores argumentam que recebem o benefício porque é um direito legal.
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QUINZE SENADORES SOMAM SALÁRIOS COM APOSENTADORIA PAGA PELOS ESTADOS
Ex-governadores, parlamentares recebem por conta de uma falha na lei
POR SIMONE IGLESIAS E CHICO DE GOIS
BRASÍLIA — Entre os 104 ex-governadores que ganham pensão especial, 15 estão cumprindo mandato de senador. Esse seleto grupo soma os dois rendimentos, beneficiando-se de uma falha na legislação, que instituiu um teto federal, mas não um teto nacional.
São eles: Casildo Maldaner (PMDB-SC), Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), Roberto Requião (PMDB-SC), Jorge Viana (PT-AC), João Durval (PDT-BA), Ivo Cassol (PP-RO), Valdir Raupp (PMDB-RO), Edison Lobão (PMDB-MA), Epitácio Cafeteria (PMDB-MA), João Alberto (PMDB-MA), Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), Agripino Maia (DEM-RN), Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), Cícero Lucena (PSDB-PB) e José Sarney (PMDB-AP), que recebe a pensão como ex-governador do Maranhão.
REQUIÃO FOI À JUSTIÇA
O Paraná chegou a suspender o pagamento das pensões em 2011, mas por decisão da Justiça, retomou este ano. Requião, então, cobrou judicialmente os recursos do período em que não recebeu sua aposentadoria. Mês passado, ganhou R$ 452,6 mil retroativos aos 16 meses que teve o benefício suspenso.
Em 2009, o Tribunal de Contas do Estado publicou um acórdão pedindo ao Congresso que buscasse uma forma de se enquadrar no teto do funcionalismo público, que é de R$ 29,3 mil, tentando evitar a soma de salários de deputados e senadores acima deste patamar.
No entanto, o acórdão nunca foi cumprido porque o Senado alega que não há como instituir um teto nacional, já que União, estados e municípios têm orçamentos e folhas de pagamento independentes.
Para resolver isso, só quando uma lei definir que exista um mecanismo capaz de detectar em todo o país o recebimento de salário por cada ente federado e, então, praticar um abate teto.
TETO NACIONAL FORA DA PAUTA
Por ora, o tema não é uma prioridade do Congresso. Não há projeto em fase acelerada de tramitação que institua o teto nacional. É uma regalia, se comparado ao que ocorre na esfera federal.
No Executivo, no Legislativo e no Judiciário, quando o servidor ultrapassa os R$ 29,3 mil, tem a diferença abatida automaticamente.
A situação dessas 157 pessoas, incluindo ex-governadores e ex-primeiras-damas, é ainda mais fora da realidade se comparada a dos milhares de brasileiros que se aposentam pelo Regime Geral de Previdência.