30/07/2019
Crusoé6: Convidado para se filiar ao Podemos, Sergio Moro evita falar de política e do seu voto em Lula
[0] Comentários | Deixe seu comentário.O ministro Sérgio Moro, nome cotado para ser candidato a presidente da República em 2022, se recusa a falar sobre o assunto.
Apesar do convite para se filiar ao Podemos, diz que não se considera político.
Se negou a revelar como é sua relação com o presidente Bolsonaro, e preferiu não comentar sobre o fato de já ter votado no ex-presidente Lula.
Confira mais sobre a entrevista ao repórter Rodrigo Rangel da revista Crusoé:
O sr. se considera um político?
Eu aceitei esse cargo, um cargo eminentemente técnico na minha opinião, até porque o ministro da Justiça e da Segurança Pública tem uma obrigação primeira com o império da lei, com o estado de direito. Entendo que esse cargo tem uma peculiaridade. E, ainda, é uma área relacionada a minha atividade anterior como juiz, sobre a qual disponha de certo conhecimento técnico. Mas, como ministro, há, sim, uma interação com órgãos políticos, como o Congresso.
Esse tipo de atividade política é inevitável neste cargo, mas não me vejo envolvido na política partidária.
É mais fácil ou mais difícil do que ser juiz?
O trabalho é diferente como juiz e como ministro. A área de abrangência aqui do ministério é grande. Como juiz, ficava vinculado a casos concretos, por mais que na 13ª Vara Federal (refere-se à vara da qual era titular, em Curitiba) a atividade também fosse muito intensa, assim como é aqui. Do ponto vista do nível de trabalho, é relativamente similar. Aqui meu papel é mais estruturante. Mas nem por isso deixa de ser desafiador. As carências são muito grandes nas áreas da justiça e da segurança pública. O trabalho é desafiador, e isso torna o trabalho interessante.
Isso o anima, de alguma forma, a tentar outros voos na política?
O foco tem sido o trabalho como ministro. Quem assume um cargo pensando em um cargo futuro provavelmente está na posição errada.
O sr. descarta a possibilidade de se candidatar a presidente da República, por exemplo?
Essa é uma questão recorrente. Acho que não faz nem sentido pensar nisso no presente momento. De todo modo, no governo federal o candidato será o presidente Jair Bolsonaro.
Hoje o sr. recebeu aqui no gabinete um convite para se filiar a um partido e ser candidato a presidente.
Ah, isso são palavras colocadas da boca para fora.
Mas qual foi a resposta?
Foi a mesma resposta. Meu foco é o trabalho como ministro. Não tenho essa intenção.
Até quando o combate à corrupção no Judiciário será um tabu?
No passado há histórico de juízes condenados criminalmente. Houve outros que, embora não condenados, foram aposentados compulsoriamente.
Não é propriamente um tabu. Existe uma discussão apropriada que envolve a dificuldade de investigação por causa do foro por prerrogativa de função e existe algum grau de corporativismo...
Ainda falta a Lavajato entrar nessa seara?
Eu penso que não se pode vulgarizar o termo Lavajato como se fosse a única investigação sobre corrupção no país. Penso que, identificados os casos de corrupção, em qualquer ramo da atividade pública, da magistratura, da polícia, do Congresso, do Executivo, esses casos tem que ser apurados e extraídas as consequências.
Mas o sr., ao que parece, faz parte do presente dele.
Bem, eu nunca tratei essas questões pelo lado pessoal. Houve uma tentativa de personalização como estratégia de defesa. Eu nunca levei para o pessoal. Vejo que a condenação do ex-presidente, até porque ele tem uma gama de seguidores fiéis, traz um grande desgaste pessoal porque eu fico até hoje sujeito a ofensas por parte desses seguidores. De minha parte, o trabalho foi profissional de julgar uma acusação que eu entendi que estava baseada em provas. Minha sentença foi confirmada em mais de uma instância. Causa até estranheza essa obsessão em relação à minha atuação.
Como é a relação com o presidente Jair Bolsonaro?
É uma relação profissional. Boa.
Como é a relação diária?
Aí são questões que dizem respeito a mim e a ele.
O sr. se sente confortável no governo?
O trabalho está sendo bem avaliado pela população. Pelo menos é o que indicam as pesquisas. Acho que o ministério está no caminho certo. Então não há motivos para não encontrar satisfação pessoal no trabalho.
O pacote anticrime vai avançar no Congresso?
Está havendo uma redução da criminalidade no país inteiro. É o que revelam as estatísticas oficiais e também as estatísticas produzidas por institutos que nem são lá muito simpáticos ao governo. Claro que isso não é resultado exclusivo da ação do governo federal. Existe mérito das forças estaduais e locais, mas o fato de haver uma queda visível em todo o país é sinal de que existe influência da ação do governo federal. Isso é muito positivo. Considerados os cinco ou seis primeiros meses do ano, são 5 mil homicídios a menos. Não é algo trivial. São vidas poupadas. São pessoas que escaparam de ser vitimas de crimes.
Há resistência à sua figura no Congresso e, também por isso, ao pacote. O que vai ser possível salvar da proposta?
O Ministério vai trabalhar pela aprovação integral, sem prejuízo de ser convencido da necessidade de eventuais modificações pelo Congresso.
É o papel do Parlamento.
Ainda recebe muitas ameaças?
Bem, existem ameaças de diversos tipos. Resolvi abrir uma conta no Twitter e basta ver os comentários. Ali há várias ameaças virtuais. Mas em boa parte dos casos me parece que não são dignas de serem reputadas como sérias, embora eu ache sério fazer ameaças a qualquer pessoa.
E as ameaças efetivas de morte?
Aí são questões de segurança, que eu não comento.
No dia a dia, seus colegas ministros o temem por seu histórico?
O presidente Jair Bolsonaro montou uma boa equipe de ministros, muito técnica, que está realizando um bom trabalho.
Há um deles investigado, o do Turismo.
Sim, mas eu não me envolvo na investigação do caso concreto. O próprio presidente solicitou que os fatos fossem apurados com presteza, e essa também foi a indicação dada a Polícia Federal, que tem feito seu trabalho sem qualquer interferência. Seria inapropriado de minha parte realizar qualquer interferência em um sentido ou outro. O papel do ministro da Justiça não é ser advogado do presidente ou dos outros ministros. O papel, no caso, é dar estrutura e autonomia à Polícia Federal para realizar seu trabalho. E as investigações avançaram bastante.
Ele tem condições de seguir no cargo?
Seria inapropriado fazer esse juízo publicamente.
O sr. já votou no PT e no expresidente Lula. Se arrepende?
O voto é secreto.
Mas se arrepende de já ter apostado no PT, hoje seu algoz?
Isso envolveria uma revelação de voto em eleições. E prefiro evitar esse tipo de resposta.
Em algum momento o sr. se arrependeu de ter deixado a toga?
Não. Absolutamente não. Nós temos o exemplo da Operação Mãos Limpas, na Itália, em que houve um grande avanço judicial em casos de corrupção seguido de uma revanche legislativa que comprometeu muito os avanços judiciais. Houve grande controvérsia, durante anos, se a Itália havia avançado ou não no combate à corrupção.
Minha intenção ao ingressar no governo foi evitar esse tipo de retrocesso. E como se diz na expressão em inglês: não enquanto eu estiver aqui. Esse é meu compromisso primário, que permanece válido.
Não houve nenhuma razão que me fizesse achar que eu tenha cometido um erro. Há muita maledicência, como a interpretação equivocada que relaciona a vitória eleitoral do presidente Jair Bolsonaro com minha atuaçâo na Lavajato. A condenação do ex-presidente Lula foi em 2017, muito distante de o presidente Jair Bolsonaro se apresentar, na minha avaliação e na de muitos, como um candidato que tivesse reais chances nas eleições de 2018.
Talvez somente ele acreditasse na vitoria. Ele se provou certo e os outros, errados. Eu não acreditaria nisso, em nenhum momento, em 2017.
Quem o presidente vai escolher para a Procuradoria-Geral da República?
A escolha é do presidente. Ele, evidentemente, recebe sugestões de ministros e de outras pessoas que buscam influenciá-lo na decisão. Claro que o ministro da Justiça tem uma participação no processo decisório, mas isso não exclui a participação de outros personagens. Mas a decisão é de responsabilidade primária do presidente.
A escolha deve ser feita dentro da lista tríplice?
Eu vejo a lista com bons olhos, já que ela representa uma escolha da classe, que revela as suas preferências. Mas o mais importante é que seja escolhido um excelente procurador-geral, quer esteja na lista, quer não.
Como o sr. define a sua relação com o procurador Deltan Dallagnol?
É uma relação profissional. O contato profissional contínuo durante tanto tempo permite eventualmente alguns momentos mais descontraídos. Mas é um relacionamento eminentemente profissional.
Em sua viagem de férias a Washington, o sr. tirou uma foto, depois postada nas redes, diante de uma frase célebre de Franklin Roosevelt ("A única coisa que devemos temer é o próprio medo"). Há algo implícito no ato?
Eu sempre tive uma admiração pelo presidente Franklin Roosevelt, assim como pelo anterior presidente, Theodore Roosevelt, que era primo dele. Acho aquela afirmação muito inspiradora. Reflete o que eu penso também.
Guarda relação com seu momento atual?
Acho que guarda relação com a minha vida inteira.